terça-feira, 10 de março de 2009

Saudade

Meu pai faria 100 anos.
Nove anos sem meu pai...
Tanto tempo junto dele
Sem me dar conta de que era o cais
Para onde todos viriam
Descansar dos temporais.

Plácido era meu pai...
Mais que isto, um sonhador.
Não era bom com as palavras,
Mas em seus olhos tinha amor.
Só percebi o quanto o amava
Pela falta que ele causou.

Nos seus últimos aniversários
Vejo agora (quem diria!)
Que economizei nos abraços
Sem saber que o teria
Por pouco tempo por perto
O pai que só então descobriria.

Êxtase 2002

Percebo a paixão como um sentimento úmido, morno, doce, terno, feliz, transformador, iluminado, que nos aproxima da dor lancinante quando há ausência e nos imerge em serenidade quando os olhares e toques são possíveis.
A paixão é como uma semeadura mágica em terreno árido, que faz surgirem cores estonteantes e cenários fantásticos.
Ela permite que, ao contato, a alma da pessoa amada seja alcançada, acariciada, clarificada e este corpo não exista mais com seus contornos tão limitantes.
A paixão inunda mansa e definitivamente, transbordando pelos olhos, voz, mãos, gestos, modificando toda uma vida para sempre.

Agonizantes animais 2002


Lua amazônica 2002


Fertilidade 2002


Celebração nipônica 2002


Meu carinho 2002

Eu me contorço em desesperada saudade, imaginando que tamanha ânsia só pode estar sendo alimentada por seu pensamento em mim. Partes minhas tornam-se sensíveis, repentina e insistentemente, ressentindo seus toques leves. Você é uma delícia de amar.
O beijo, forte, impõe seu sentimento com doçura ou através de uma pressão que me diz possuo, tenho, posso, estou aqui sobre você, desejando - enlouquecida por tanta ausência - tudo aquilo que quiser me dar e eu quiser tocar. Eu te amo e os seus carinhos.
Carinhos que me pintam na pele invisíveis quadros superpostos que se fixam em minha alma como um suave tecido com que me envolvo na sua falta. Eu te amo e a cada vez é mais intenso, como sua voz em meus sentidos.
Sua voz que me esvazia de pensamentos e me preenche de seu desejo, que me transporta para o quase intocável, que me acende um mundo de delícias em cada detalhe que sou, que me impede qualquer outra percepção.

Adoração 2002


Chuva cósmica 2002


Mel rosé 2002


Compaixão 2002

Chove fino. Caem gotas leves sobre minha alma de barro seco, que não conhece flores há muitos anos. Arrasto-me dolorida, sem erguer os pés nos passos inchados, as roupas em trapos, encardidas pela aridez de minha paisagem interior que suga a luminosidade da janela sem êxito. Quando choro não me rego, é apenas a vazante de um rio subterrâneo que, na superfície, secou faz tempo. Minha pele é de camaleão, opaca, confundida com os dias amarelentos. Sabor de giz na língua, saliva grossa de sede, cabelos de quem não se vê no espelho. Não mais rimo a dor com outros sentimentos, olho o céu e vejo partes isoladas da natureza unidas pela lógica do universo. As aves são barulhentas, os animais rasteiros incômodos, os maiores, temeridade. Sofro em uma depressão longa, da qual não se vê o final no horizonte estéril. Sigo em frente, sem lágrimas, sem dor no coração, porque o desconheço. Que é de mim? Não lembro... Há tempos tive sonhos, hoje não durmo. Meus olhos seguem duros por sobre o isolamento, fixos em frente, sempre, fiéis à direção de meus passos involuntários. Quero cair, prostrar, esquecer... morrer sob um céu que não protege.

Paixão solar 2002


Flores em escarpas 2002

Hoje você foi uma sombra que persegui e perdi por um minuto. Ficou a sensação de mãos que não conseguem alcançar, mas que deixam no ar um movimento bonito durante a busca, a tentativa. Era eu um minuto atrás de você que se foi sem saber de meus olhos.
É assim essa parte da vida: você que vai e eu que vejo, sem tocar ou chegar perto, apenas olhando e sentindo.
E isso me aquece: a sua existência e o meu sentimento. Até que transborda por completo e dá lugar ao vazio frio que me faz desejar o tocável que então busco; mas, ao encontrar, junto está a sua ausência, que torna o palpável impossível de me preencher.
Então me afasto, me volto para você e o ato simples de olhar me basta novamente.

Estouro da boiada 2002


Poder celestial 2002

Como um imenso manto negro pairo sobre sua casa. Encubro telhado, terraço, plantas, janelas, portas, garagem, portão. Impeço o dia para que durma e sonhe. Para que acorde, imaginando que vive enquanto se ocupa dos acontecimentos diários, sem perceber sua voz triste, opaca e vazia. Ao mesmo tempo sua alma secular descansa em um sono ameno de lembranças; vive sorrisos, palavras, toques, tristezas, distâncias, saudade, gestos... e sonha o futuro. O dia em que você levantará da mesma forma que sempre, mas intuirá que dorme; buscará, sem bússola ou horizonte, a resposta para sua inquietação e, após horas cansativas na semiconsciência da incompletude, só restará a opção de repousar a cabeça sobre o travesseiro e chorar, lágrimas que sofre sua alma quando você diariamente parte sem ela. Neste momento, chorarão, você e ela, sobre a mesma cama, ocupando o mesmo espaço. A dor da falta de sua essência fará com que a sinta em si, que se una a ela e se perceba inteiramente: parte de um caminho maior do que essa vida. No dia seguinte serei um manto leve e claro envolvendo você, assim que acordar, protegendo seus passos em direção a um seu destino que se encontrava, há anos, abandonado.

Volúpia 2002

Eu te amo com a urgência de um guerreiro que luta por sua vida para salvar sua alma; com a urgência dos anjos que velam pelos seres que, sós e cegos, se perderiam de seu caminho; com a urgência de ver os dias que, implacavelmente velozes e ininterruptos, consomem e restringem o tempo do encontro pleno; com a urgência que teme a morte que virá, sempre breve, quando se é feliz; com a urgência dos lábios adormecidos que sonham beijos doces; com a urgência de minhas mãos que aguardam enlaçar e trazer para junto, definitivamente, uma vida tão desejada; com a urgência de um coração que pulsa teu nome, aflito, pedindo aos olhos tua imagem presente todos os dias; com a urgência dos amores proibidos em se tornarem vivos; com a urgência da solidão que sabe sua companhia vindo. Eu te amo com a urgência deste sentimento que te acompanha ao longe e que te faz sentir a mesma urgência, transbordar o mesmo carinho, viver a mesma paixão. Sempre.

As iabás 2002


Matizes 2002

Misturo letras com amor para que, à noite, elas possam te chegar delicadamente, uma a uma beijando tua pele, como se meus lábios fossem.
Tranço as palavras delicadamente para que, à noite, elas possam te acariciar a saudade, aquecendo teu coração, como se fossem minhas mãos.
Teço as sentenças com cuidado para que, à noite, elas possam te enlaçar carinhosamente, de maneira lenta e doce, como meus braços o fariam.
Vou urdindo textos pouco a pouco, atenciosamente, para que neles, à noite, possa repousar teu corpo macio enquanto o percorrem as letras, as palavras e as sentenças que, unidas, buscam te cobrir suavemente para que durma, sonhando com uma história que te envolve e faz feliz.