domingo, 31 de maio de 2009

Consciência

O sol já brilha
Acordemos pra vida
Expandindo luz

Consciência:
Viagem interior
Tornar-se a luz.

sábado, 30 de maio de 2009

Temporada das Flores - Leoni

Que saudade! Agora me aguardem,
Chegaram as tardes de sol a pino.
Pelas ruas, flores e amigos
Me encontram vestindo meu melhor sorriso.

Eu passei um tempo andando no escuro,
Procurando não achar as respostas.
Eu era a causa e a saída de tudo
E eu cavei como um túnel meu caminho de volta.

Me espera, amor, que estou chegando,
Depois do inverno a vida em cores.
Espera, amor, nossa temporada das flores.

Eu te trago um milhão de presentes
Que eu achava que já tinha perdido,
Mas estavam na mesma gaveta
Que o calor das pessoas e o amor pela vida...

Me espera, estou chegando com fome,
Preparando o campo e a alma pras flores,
E quando ouvir alguém falar no meu nome,
Eu te juro que pode acreditar nos rumores.


Fuga

Escotilha para o futuro, o “surto”
Quando minha mente vagueia solta
Para além do que, hoje, posso e sou,
Liberta-me da mesmice dos dias
E traz no desvario das atitudes
A fertilidade, a possibilidade, o impulso.

Já não me cabe o espartilho
Que imobiliza, nem a conveniência.
Melhor a verdade, o incômodo provocador
Daqueles que, a todo custo, sabem
Que ainda que pareça tarde,
Sempre existe uma saída, a demência.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Corrente

Conecta
Oração
Riacho
Reprime
Enlaça
Numinoso
Travessia
Enfeite

A Lucidez Perigosa - Clarice Lispector

Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
Assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.

Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.

Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
– já me aconteceu antes.

Pois sei que
– em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade –
essa clareza de realidade
é um risco.

Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.

Saudade

Sombra que te acompanha,
Aguardando se concretizar
Uma vez mais.
Doendo fino e permanentemente,
Adiando uma nova realização.
Despertando as lembranças vividas e
Enlaçando-te com seu gozo de ilusão.
.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Conselho

Nunca diga sim para perguntas indiscretas, pois, às vezes, as respostas podem ser constrangedoras.

Na Terra dos Sonhos

Um dia estava eu andando por uma estrada deserta quando me dei conta de que estava cansada de prosseguir minha vida como vinha fazendo até então.
É que já estava farta de trilhar caminhos conhecidos, sempre o mesmo previsível desenrolar dos fatos, as mesmas pessoas a passarem por mim, as tarefas iguais a desempenhar, a criatividade como meta a ser alcançada depois.
Depois de quê? Será que haverá depois para quem se perde no agora? É possível esperar indefinidamente para ser o que se pensa que é sem correr o risco de ir amofinando, amarelando, desaparecendo do mesmo jeito que essa esperança vã que é o destino dos tontos que se aferram à realidade esquálida e sem sumo do cotidiano?
Estar ali, só, como há muito tempo não me acontecia, me deu ensejo a marcar um encontro com essa eu que tinha o costume de postergar o que era importante. Queria há tempos dizer a ela umas verdades. Quem sabe poderia compreender que tanta responsabilidade, tanta necessidade de segurança não combinava definitivamente com alegria de viver, espontaneidade e deslumbramento. E mais, teria que saber, sua rigidez quadradinha só atrapalhava às outras: ousadas, confiantes, autênticas, que habitavam o mesmo corpo.
Ela me ouviu, eu acho. É que, inexplicavelmente, senti um sopro diferente dentro de mim. A coluna endireitou, o peito se abriu, as juntas se soltaram, estava mais leve e, ao mesmo tempo, tinha ficado mais dona de mim. E brilhava, sentia uma corrente passar por mim e meu coração expandido numa alegria sem motivo. Sorria um sorriso puro, pra ninguém, continuava só, andando na mesma estrada.
Caminhava um passo após outro, em frente sempre, no mesmo ritmo, num estado de tal alheamento que aos poucos percebi que subia na diagonal, tornando-me cada vez mais leve, fora de mim.
Fechei os olhos e me deixei ir por um momento, que me pareceu infinito em seu significado, mergulhando numa realidade que não havia antes experimentado.
Eu era todas e nenhuma. Era unicamente luz. Vibrava o que sabia ser amor, estava preenchida, ligada a tudo, eu era tudo, nada pensava, estava no vácuo. E pela primeira vez eu era.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Entendendo Quem Nós Somos e Aplicando Este Conhecimento no Dia a Dia

Você acredita que o que pensamos ser a realidade é pura ilusão? Pois é só ilusão. Todas as coisas que enxergamos, tocamos, todos os sons que ouvimos, tudo que tem cheiro, tudo que conseguimos provar, enfim, tudo que apreendemos com os cinco sentidos, isto é: os objetos, a natureza, os seres vivos, tudo isso não passa de ilusão. Eles só existem dessa forma que os concebemos, porque nós estamos observando cada coisa.
Parece difícil compreender este conceito mas, na verdade, não é tão complicado. Existe uma realidade manifesta e outra não manifesta.
A realidade não manifesta é a fonte. É o manancial de onde tudo tem origem. É a partir dela que surge a realidade manifesta. É a verdadeira realidade.
A realidade manifesta - que é o que nós apreendemos com os nossos cinco sentidos - é pura ilusão, porque depende do observador, de quem a concebe.
Assim, nós só conseguimos olhar um gato sabendo que se trata de um gato, depois que já tivermos sido apresentados a ele, isto é, depois que o nosso cérebro já tiver registrado o que é um gato.
Tudo o que se manifesta no mundo vem dessa realidade não manifesta, que é o Todo (o que chamam Deus, campo, fonte, energia, luz ou seja lá o que for). Tudo o que existe tem em si a centelha desse Todo. Então, nós temos nosso espírito que é derivado dessa fonte. Logo, em espírito, estamos ligados ao Todo, a tudo que existe, somos um com a Unidade.
O homem é composto pelo espírito (derivado do Todo, a realidade não manifesta), a mente (o ato de observar) e o corpo (o que é observado).
Dessa forma, nós podemos nos identificar com a realidade não manifesta que é o desconhecido, o invisível ou com a realidade manifesta que é o conhecido, o visível.
Acontece que a realidade não manifesta é a fonte da criação, é a potencialidade pura. Aí, tudo é possível. Se atuamos nesse nível estamos livres da relação espaço-temporal, podemos aplicar a magia, afinal, temos poder, temos um Deus dentro de nós. E esse é verdadeiro poder, aí nós somos a divindade, logo somos belos, perfeitos, temos todo o conhecimento, experimentamos o silêncio, a simplicidade, a invencibilidade, a felicidade. Isso representa a auto-referência, a referência do espírito, o real poder, a identificação com o Eu, com o interior.
Mas podemos nos identificar com o externo, com as coisas, com as pessoas, as circunstâncias. É a objeto-referência. Aí somos frágeis, temos necessidade do falso poder, aquele que deriva da necessidade de controle, portanto, do medo. Quando não nos identificamos com a nossa parte espiritual somos vulneráveis, temos medo e precisamos nos defender surgindo a necessidade de controlar, nos antecipando sempre, gerando estresse para as nossas vidas, buscando o falso poder.
Então, a solução é vivermos de acordo com a verdadeira realidade: que somos seres de luz, que podemos nos identificar com o poder real que reside em nós.
Mas para acessarmos essa porção do nosso ser teremos que penetrar no silêncio, no espaço entre nossos pensamentos, mergulhar aí, onde escapamos da relação espaço-temporal, onde simplesmente somos.
Podemos alcançar esse estado através de insights, auto-hipnose, grandes choques (que por instantes nos tira do estado de ilusão em que comumente vivemos), da ioga, da meditação, do tratamento homeopático, da acupuntura e outras formas, como, por exemplo, com o uso de drogas psicodélicas que levam a estados de êxtase quando nos ligamos à Unidade. Quando experimentamos esse estado de consciência alterada, podemos sair do corpo; criar a própria realidade; experimentar estados de união com tudo que existe, animado ou inanimado; mexer com o tempo, alargando-o ou restringindo-o; fazer auto-curas; ter todo o conhecimento; conhecer todas as vidas passadas etc.
Cabe somente a nós a escolha, em cada momento de nossas vidas: viver de acordo com a verdadeira realidade ou continuarmos iludidos, limitados e infelizes.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Diversidade

Grão de areia pequenino,
Rochas, montanhas, vulcões,
Lagos, mares, oceanos,
Florestas, campinas, sertões,
Brisa, ventos, tornados,
Terremotos, tsunamis, trovões,
Asteróides, cometas, estrelas,
Maremotos, relâmpagos, monções.

Universo que se manifesta
Em tão variadas facetas,
Ensina-me, natureza, a esperar
Da vida só iniquidades
E, da criação, falsetas.

Solteira Inveterada por Água Abaixo

Sonho com vagas longas que calmamente chegam e vão outra vez, num movimento cadenciado de renovação. Há, ainda, no meu sonho, um caminhão, daqueles com escadinhas na parte traseira, onde os moleques se penduram para pegar carona de bicicleta, que entra nas águas verde-claras e é seguido alegremente por uma pessoa conhecida minha, a mais sonhadora e fora da realidade que eu já vi. Os dois, caminhão e mulher, entram nas águas. Essa visão me diz algo que ainda não consegui captar totalmente. Entretanto, sei que essa imagem vai me acompanhar por todo esse dia. Não apenas o quadro, mas, sobretudo, o significado mais profundo, o que me faz sentir ao trazê-lo à mente. É uma sensação de conforto, de alívio, de impulso, de amplidão, de fim de filme quando então está tudo bem. Percebo que simboliza aceitar o destino, caminhar em direção à felicidade sem as amarras, os impedimentos que sempre tentam justificar a nossa habitual recusa em evoluir. Assim eu sei que é chegado o momento de ir mais rápido, de crescer e dar frutos nessa existência. Sei que, finalmente, me rendi aos desígnios do destino. Agora, braços dados, casamento ideal,seguem juntos livre-arbítrio e predestinação. Não como dois namorados imaturos que se batem continuamente para, em seguida, trocarem beijos apaixonados de quem pensa que acertou; mas como adultos que caminham de forma segura e integrada, sabendo que o papel que ambos desempenham não é desvinculado um do outro, não se expressam isoladamente, fazem parte de um todo indivisível, absoluto. Essa fusão que não diminui as partes, que expandem num nível além da visão dos sentidos: é o sentido da própria vida, é o poder real que todos almejam.
Como expresso nesse sonho, estou casada, por destino e escolha consciente, demorada, eu bem sei, mas certa. E experimento, agora, um poder bem maior do que sempre tive. Não o poder de andar solta, de ter iniciativas e concretizá-las sozinha, trilhando o caminho que bem escolhesse. Mas o poder de compartilhar que só traz expansão, novas possibilidades e ampliação da área de atuação. E ainda, a maior recompensa: a paz, o tao do amor.
A imagem é bem clara: ir de encontro a algo mais amplo, ao aceitar-se a carona que a Vida nos propõe.

O Corpo e Seus Símbolos

O Corpo e Seus Símbolos: uma antropologia essencial - Jean-Yves Leloup

Examina o corpo como guia de informações que traduzem a verdade de cada um, integrando os aspectos físicos, psicológicos e espirituais. Mostra como o corpo conta a história do ser: pessoal, interpessoal e transpessoal. Enfatiza que ao considerar a doença e os sintomas, o terapeuta deve propor que o paciente não se identifique com eles e sim procure estar além deles, sendo o sujeito e não o objeto de suas dores. A doença deve ser o guia para o aprimoramento do ser, é a sua mensagem.
É ótima leitura, integrando várias fontes de conhecimento, inspirando novos estudos e correlações.
O aspecto de maior importância é encorajar a leitura do corpo pela própria pessoa, sem desconsiderar as correlações já existentes; mas, como no caso da interpretação dos sonhos, cabe ao próprio fazer a melhor leitura, a mais abrangente e fidedigna.

domingo, 24 de maio de 2009

Feliz Aniversário, Jorge!

Hoje é seu aniversário e tantos desejam com você comemorar! É dia de ser feliz, do sol brilhar, de abraços, de beijos, de festa e de alegrias. Mas, a comemoração maior é sua, particular, de louvar tudo que possui de mais precioso: a lucidez, o espírito humanitário, a capacidade de amar, a capacidade de expressão.
Você é um cidadão do mundo, interessado em tudo que acontece nos seus arredores, no seu estado, no seu país, no universo. A globalização tem tudo a ver com você.
É pessoa compassiva que ao longo da vida misturou-se a muitas outras pessoas, muitas vezes responsabilizando-se por suas vidas, sempre ajudando a conhecidos e desconhecidos que surgiram no seu caminho.
Foi chamado à responsabilidade muito cedo e tornou-se a figura do pai amoroso, aquele que acompanha, que instrui, que abre caminhos e, principalmente, dá liberdade aos filhos. Teve oportunidade de ser o pai não apenas dos seus filhos naturais, mas também de tantos que necessitaram de sua orientação e cuidados.
Seu interesse por gente, sua capacidade de observar além das aparências fez com que amealhasse ao longo da sua vida, muitas histórias interessantes que você traz na memória e, de uma forma toda especial, brinda os seus amigos e conhecidos com seu relato apaixonado.
Mas, o aspecto mais interessante de sua personalidade é a abertura para o numinoso. As ocorrências da sua vida têm muito de extraordinário, de espiritualidade manifestada. E, creio eu, isto só acontece com os grandes homens, aqueles que vão deixar sua marca nos corações de tantas pessoas, pois que sua passagem por esta vida, deixa um rastro de luz.
E, esta luz você necessita refletir e o faz, perfeitamente, nas manifestações artísticas. A expressão pela arte embeleza a sua vida e a dos que o acompanham. É um presente para todos.
Parabéns pelo seu aniversário. Encontrar com você nessa vida foi um presente especial. Que você tenha muitos anos para viver perto de todos nós dividindo suas experiências e irradiando a sua luz. Um grande abraço. Felicidades!

Estou Lendo...

Radiestesia Médica Fácil y Práctica, de Profesor D’Arbó.

sábado, 23 de maio de 2009

Amor

Experimento um momento feliz, com um sublime sentimento de amor que me faz dar um passo ousado em direção às pessoas, mesmo correndo o risco de cair no ridículo de ser incompreendida por aqueles que ainda não se acostumaram a manifestações espontâneas de apreço aos semelhantes.

Outro Olhar

Há dias em que sinto grande necessidade de olhar. Olhar para as pessoas, para as suas ações, para a sua passividade, para o que deixam fluir.
Nessas horas eu me alimento do que vejo. As imagens impregnam o meu corpo emocional e os olhos que vêem são olhos de compreensão, que estabelecem a ligação com o amor universal.
Vejo o que está por trás das pessoas, as manifestações do seu inconsciente e elas se fundem com o que também está fluindo de mim.
Preciso tantas vezes me reabastecer desse contato especial com os humanos.
Isso me dá grande alegria. Eu me renovo, a minha energia flui melhor, livre dos bloqueios das relações comumente estabelecidas no dia a dia.

A Vidente - Clarice Lispector

A cozinheira é Jandira. Mas esta é forte. Tão forte que é vidente. Uma de minhas irmãs estava visitando-me. Jandira entrou na sala, olhou sério para ela e subitamnte disse: “A viagem que a senhora pretende fazer vai-se realizar, e a senhora está atravessando um período muito feliz na vida.” E saiu da sala. Minha irmã olhou para mim, espantada. Um pouco encabulada, fiz um gesto com as mãos que significava que eu nada podia fazer, ao mesmo tempo em que explicava: “É que ela é vidente.” Minha irmã respondeu tranquila: “Bom, cada um tem a empregada que merece.”

O Poder da Imaginação

Imaginar é:
Sonhar e acreditar
Pra realizar.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Trem das Cores - Caetano Veloso

A franja na encosta cor de laranja
Capim rosa chá
O mel desses olhos luz
Mel de cor ímpar

O ouro ainda não bem verde da serra
A prata do trem
A lua e a estrela
Anel de turquesa

Os átomos todos dançam
Madruga reluz neblina
Crianças cor de romã
Entram no vagão

O oliva da nuvem chumbo
Ficando pra trás da manhã
E a seda azul do papel
Que envolve a maçã

As casas tão verde e rosa
Que vão passando
Ao nos ver passar
Os dois lados da janela

E aquela num tom de azul
Quase inexistente,
Azul que não há
Azul que é pura memória de algum lugar

Teu cabelo preto explícito objeto
Castanhos lábios
Ou pra ser exato
Lábios cor de açaí

E aqui trem das cores
Sábios projetos:
Tocar na central
E o céu de um azul celeste celestial


O Meu Trem das Cores

Ao ouvir esta música com seus versos de tão linda inspiração, não posso deixar de me transportar para este trem também.
Agora eu me sinto como este compositor que passa num trem. E está vivo, tão vivo como tudo que apreende com os olhos e com o coração. Do trem ele observa a natureza, as pessoas, o movimento do dia acordando, as pessoas na estrada. Ele próprio vai sendo acordado pelo que vê e o toca de forma tão profunda. E as cores são o portal que permite que ele, de repente, mergulhe naquela outra realidade do que observa. Ele se deixa impregnar pelo que vê. É atravessado pelas imagens e cada uma consegue deflagrar no seu âmago uma explosão de belezas que ele decodifica em versos tão lindos.
Porque os versos estão vivos. Eu mesma sinto o cheiro da manhã, o frio da névoa úmida e o calor do seu peito que, certamente, ama aqueles lábios cor de açaí. Porque aquele homem que observa é tão vivo que só pode mesmo amar a vida e alguém em especial.
O trem passa. As cores vivem. Ele observa e é observado. Nós também, ao passarmos pela vida, olhamos e somos vistos por ela, os dois lados da janela. O aqui agora é assim mesmo. É calmo e é dependente de total atenção, para que não se perca nada. E, não mais que de repente, algum pequeno detalhe, um certo tom de azul inexistente, traz um déjà vu, uma memória qualquer é acessada e entramos em outra realidade que já vivemos anteriormente. E isto é um bálsamo. Adoro esta música porque, para mim, viajar é meditar. É olhar pela janela do trem ou do ônibus, atravessar a porta do tempo e banhar a minha alma em águas já antes visitadas.
E esta música é tão incrível que mostra como uns instantes de desprendimento podem ser tão revigorantes para nós. Assim, no final da música ele fala em sábios projetos, tocar na Central. Ou seja, ele captou a grande delicadeza das coisas simples e pensou em levar sua arte para um lugar que nos dias comuns convive com a dureza, a insipidez da rotina, mas que, ao mesmo tempo, examinada por alguém que transborda sensibilidade, pode oferecer frutos tão doces e suculentos (vide a seda azul do papel que envolve a maçã).
E ele é transformado pelo que vê com os olhos do coração e insere esse quantum de amor nos seus projetos que agora são projetos para o outro, o semelhante.
Eu penso que melhorar o mundo é conectar com o interior, receber o amor que transborda e então dirigir esse amor para o outro, para o mundo.

Atitude

A vida é o que fazemos dela. A cada dia descobrir a inteireza do que vivemos deveria nos fazer pensar no que poderíamos ser, se nos permitíssimos, se nos déssemos a chance de sermos quem realmente somos.
A beleza está dentro de todos nós. Não importa em que condições vivemos, não importa o que já sofremos, o que nos fez chorar e endurecer. A possibilidade do bom está em cada um. A harmonia, o sossego, o belo estão bem aqui dentro de nós. É só contactar, é só abrir os canais.
Como acordamos? Será que olhamos por um só instante a pessoa que está ao nosso lado? Será que a tocamos, encostamos nosso corpo no dela? Pense que essa pessoa dormiu com você, dividiu talvez o mesmo sonho. Quem sabe? E ela está ali. Ainda dorme. Está relaxada, a pele quente e gostosa. Você já percebeu isto?
Sim, eu sei que é preciso iniciar o dia, sei dos compromissos, do que teima em puxá-lo para fora da cama. Mas fique mais um pouco, por mais um tempinho só. Viva esse momento que é seu, por direito. Comece o dia com a aproximação do outro. Puxe para você a pessoa com quem divide a vida. Dirija a ela uma vibração de amor, uma doçura, uma carícia. Mesmo se vocês não estiverem muito bem nessa fase. Você quer estar bem, é isso que seu coração pede, os problemas podem ser resolvidos pelo carinho, pelo amor; se abra para o outro, escute o seu coração, deixe a cabeça de lado, o orgulho, jogue fora as mágoas, derrube as cercas que ainda o aprisionam.
E se voce não divide a cama com ninguém, aproveite a delícia que é o contato consigo mesmo. Não pule logo para fora da cama. Você já espreguiçou? Já se espichou como um gato? Já tentou se expandir pra vida? Esse movimento pode fazer uma grande diferença pro seu dia. Os tempos de agora pedem expansão. Vá para os outros, procure as pessoas num relacionamento de verdade, inteiro, espontâneo, o movimento das crianças. No outro está sua cura, está você. Descubra no outro toda a beleza que também existe em você. Tenha paciência com você, desculpe suas imperfeições, seus exageros, suas omissões. Mas se dê oportunidade de ser melhor, de elevar seus padrões, de construir para sua vida a única coisa que você vai poder levar quando se despedir dela: construa extensões do amor que existe em você. Deixe o amor se expandir para fora de você.
Esse amor vai tocar o amor do outro, de todos que estiverem perto de você e longe também, porque o amor é poderoso, é a única proteção real que você pode ter. O amor vai dissolver seus medos, vai trazer para você belos acontecimentos hoje. Suas oportunidades serão outras se você se soltar para a vida, se permitir emanar de você mesmo esta coisa divina que é o amor.
É você que faz sua vida, seu novo dia, seu futuro. O que faz e o que deixa de fazer neste momento vai plasmar seu futuro. Não tire de você a responsabilidade por tudo que lhe acontece. Porque é assim mesmo. Isso não é ruim, não é injusto, isto é só uma possibilidade. Você tem escolhas, você pode. Pode tudo, ainda que pareça absurdo, você tem esse poder. E esse poder é, muitas vezes, não ter poder. É deixar-se levar. Mas cultive em você esse hábito de perceber a cada momento que você pode mudar a sua vida e a dos que estão ao seu redor, que você é essa sociedade que lhe parece tão diferenciada de você. Você é essa realidade que você vive. E o que você deixa sair de você cria a atmosfera que você respira, atrai o que você permite, o envolve em vibrações que você mesmo envia. Então resgate o contato com o divino que está em você. Assuma todo o seu poder. Melhore seus dias e seus relacionamentos. Fique mais inteiro, se expanda, melhore essa vida, esse planeta, atraia para você tudo que você puder deixar sair de bom de você mesmo. É assim que funciona. Experimente.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

A Meditação da Água

Lentamente escorrego para fora da cama, meio trôpega ainda, meio cega, um tanto atônita, com o peito carregado ainda pelas emoções da noite que passou e me dirijo ao banheiro.
Ainda sem enxergar, molho as mãos na água fria e banho o rosto num movimento de acariciar a pele, acordando-a devagarzinho. Encho a boca de água, banho o nariz, os olhos e vou percebendo melhor o início do dia. Seco o rosto, as mãos e ando até a cozinha onde escancaro a janela e páro ao lado do filtro de barro.
É aqui que se inicia o ritual de uma meditação. Nesse momento, eu me confundo com a manhã e vou acordando como ela. Eu com a água, ela com o sol.
Olho para fora da janela e me deslumbro com o dia que ainda não é de todo. O céu ainda é chumbo. A cidade dorme. Olho por cima dos prédios. Estou bem no alto. Vejo a copa das árvores, os edifícios ao longe, a rua ainda deserta.
A janela aberta me permite ouvir o som de fora. Ainda não há os sons de costume, aqueles que ouvimos diariamente, a partir de certa hora: sons de buzinas, de motores de carros, ônibus, sons de correria, de loucura, de gritos que libertam por momentos curtos, almas imprensadas numa cidade já quase desumana.
Agora os sons são tranquilizadores. Escuto o vento, o farfalhar das folhas das árvores, algum tímido passarinho que já acordou, um cachorro sonolento que tenta dizer aos donos que já está de pé. E ouço os galos cantarem. Não sei bem onde ainda existem galos nessa cidade. Mas o fato é que eles me acompanham. Onde quer que eu vá sempre escuto um galo cantar na manhã, me trazendo a infância de volta todos os dias, a me lembrar que ainda sou quem sempre fui, que minha pureza e espontaneidade, minha emotividade estão guardadas em mim e, a qualquer instante, podem ser acordadas por esses galos do alvorecer.
Encho o primeiro copo de água, limpinha, fresca, do filtro de barro. Olho a água como se olhasse o mar. Chego a sentir o cheiro de maresia e o frescor da brisa que sopra perto do mar. É o primeiro copo dos seis que vou bebendo devagar todas as manhãs, inaugurando meu dia com esse contato silencioso com o mundo, um contato sem palavras, só de sensações, de captar com todos os cinco sentidos a vida que está em volta. Assim, vou me acordando e despertando outros sentidos. A água enche minha boca e escorre para dentro. Isso mexe com a respiração. Respiro o dia, resgato todos os dias o bebê que respira pela primeira vez, a descoberta do mundo. Escuto um passarinho, o som limpo. Vejo uma janela se abrindo, alguém se levanta e começa a viver o hoje.
Bebo outro copo e o fluxo das águas em mim me faz perceber um movimento do meu tubo digestivo, que vai acordando. Percebo barulhos internos enquanto olho o céu que agora já está sendo rasgado pelo sol. Já não é chumbo, já há claridade. Um sino soa ao longe. Bebo mais água. Alguns músculos se soltam nas costas. Os olhos estão mais abertos, já vejo com nitidez o mundo lá fora. Penso na noite de ontem. Sinto a felicidade de estar viva, de amar, de ter vindo até a janela com minhas próprias pernas. A água que molha meus tecidos e abastece meus órgãos, limpa as vísceras, traz renovação, me acorda, me purifica. Os pensamentos são claros. A cada copo que bebo sinto que me abro pra vida como a noite que vai-se afastando aos poucos, permitindo que o dia chegue com o sol. E o céu vai-se abrindo. Os passarinhos voam. Escuto o barulho do meu intestino espreguiçando lá dentro. Já estou no quinto copo. E quero mais água. Sinto as ondas chegando para mim, por dentro, mas é como se estivesse no mar. As ondas me cobrem, a água traz o fluxo da vida.
A cidade vai acordando, eu recebo mais esse dia, feliz por estar comigo, por me perceber inteira, por sentir que amo, que sou amada, que dormi bem, que continuei o sonho do fim da noite e vou levá-lo comigo no coração, nesse dia que já nasceu.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Dúvida

Sublime ignorância: quando dei por mim estava a um passo do ridículo. O que fazer quando a emoção nos embota a razão a ponto de suprimir todo o conhecimento prévio?

Atitude

Nos dias de hoje, se souberes lidar com a raiva e a tristeza em qualquer momento e se fores sempre paciente, valerás por cem homens.

Comida do Terceiro Milênio

Luz alimenta.
Nem só de matéria
O corpo vive.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Paciência

Escaparás de cem dias de raiva ou um momento de tristeza se fores paciente nessa vida.

Consciência

Saber decodificar o exato instante, que mensagem ele nos apresenta. O que cabe a nós aquiescer? Estamos aqui, quem sabe para consentir apenas, para aceitar os acontecimentos e tirar de cada vivência o melhor que ela puder nos dar (vide “Seja feita a vossa vontade assim na Terra como no Céu.”).
Mas somos seres teimosos por natureza. Achamos que podemos ter o controle, que sabemos o que sempre devemos fazer ou viver.
Vã inocência! Que idiotas somos nós.
É preciso entender que devemos simplesmente confiar, pois só à Vida tudo devemos e só ela sabe do plano maior reservado para nós.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Tristeza

Tristeza é pensar que escaparás do inferno se fores paciente por cem dias sem sentir raiva por um momento.

Dia das Mães

Parabéns, mamães.
Vocês merecem tudo:
Paz, amor, beijos.

Mãe dá semente,
Faz o rebento crescer
Dando seu amor.

domingo, 17 de maio de 2009

Constatação

Se por cem dias fores paciente, não se permitindo um só momento de raiva, ainda assim não escaparás da tristeza.

Destinos Cruzados, Escolha Equivocada

Enfim chegou o tão esperado dia, o dia em que iam todos à praia. Acordaram bem cedo e foi uma farra desde antes de todos entrarem no carro e, na maior bagunça, seguirem rumo ao mar.
A viagem era longa, vários quilômetros até lá. Precisavam sair bem cedo, para pegar o melhor do sol da manhã, porque eram cinco crianças e todas já quase pretas de tanta exposição continuada nas brincadeiras de todos os dias na piscina de plástico colocada no quintal, naquelas férias inesquecíveis. Nem queriam comer ou beber alguma coisa antes de sair. Estavam ávidos pelas brincadeiras. Só acordaram, molharam o rosto, fizeram xixi e trocaram os pijamas pelos calções e maiôs. Vinham correndo, descendo as escadas sonolentos, tropeçando nas toalhas, baldinhos, deixando cair pás, bolas e outros brinquedos.
O pai e a mãe os acompanhavam, mas principalmente o pai, não dispensava o café quente que tomava devagar, enquanto comia, se deliciando, o pão quentinho da padaria do bairro, trazido pela esposa que tinha muito mais energia que ele nas primeiras horas da manhã, tão habituada que estava com o excesso de disposição dos filhos que a consumia de manhã à noite, quando o último conseguia pegar no sono.
Seguiram então os cinco, se estapeando no banco de trás, gritando uns com os outros, reclamando a interferência da mãe para resolver questões entre eles, geradas por ciúmes ou birra mesmo.
Já estavam agora, acordadíssimos e ainda não eram sete horas. O trânsito ainda estava fluindo bem e já chegavam à estrada principal que os levaria ao tão sonhado destino, quando um barulho alto e repentino, seguido de um pequeno solavanco anunciou que um pneu havia estourado. Pararam no acostamento debaixo dos berros dos pequenos que queriam sair, todos ao mesmo tempo, pela mesma porta, apertando a mãe que ficava espremida pelo banco empurrado por eles antes que conseguisse levantar completamente. Olharam para o pneu murcho e souberam que isto atrasaria ainda mais os seus desejos inadiáveis de cair na água e rolar na areia. O pai, apesar do café, ainda sonolento, saiu incrédulo para averiguar o que ocorrera. Era mesmo um rombo no pneu. Ele não havia simplesmente furado e sim rompido, deixando um naco de uns dois centímetros na borracha. Passou a mão pela testa molhada, abriu o porta-malas e qual não foi a surpresa ao verificar que o estepe não estava lá. Desesperado pensou: como? O que teria acontecido? Puxou para o lado todas as bungingangas deixadas ali pela esposa e as crianças, na esperança de que o pneu estivesse escondido, fora de lugar. Qual nada. Tinha sido mesmo retirado de lá. Repassou na memória se teria deixado o carro para limpeza ou conserto em algum lugar, recentemente. Mas não. Estava certo de que não fizera isso. Mas e aí? Qual seria a explicação? Agora já começava a ficar vermelho, enquanto as crianças o puxavam pelo braço, gritando que trocasse logo a roda, que queriam seguir para a praia. Estava atônito. Voltou-se para pedir a ajuda da esposa que meio amarela, estava no extremo oposto e gaguejando, confessou que tinha retirado o estepe na semana anterior, para transportar algumas coisas na mala até a casa da irmã que ficava na mesma rua onde moravam e, por um desses caprichos do destino, tinha esquecido de repor o estepe no carro.
E agora? Não poderiam prosseguir até a praia. Não tinham como sair dali. Como comunicar isto às crianças? Como contê-las na sua ânsia? E como garantir a ordem, se ambos não sabiam dar limites nem a si mesmos?
Entreolharam-se com muita raiva, querendo um pular no pescoço do outro para reclamarem de tantas insatisfações mútuas acumuladas, enquanto em volta, as crianças absorviam aquele clima de tensão e se gadunhavam entre berros. Ele, arrependido por um dia ter desposado alguém assim tão desatento e irresponsável. Ela, maldizendo o dia em que conheceu um sujeito tão descansado, a quem pedia a mesma coisa inúmeras vezes seguidas, antes que se dispusesse a sair do lugar. Afinal, era ele quem deveria há semanas atrás, ter transportado os objetos para a casa da cunhada e não ela. Ele, bêbado de sono, preferiria estar ainda dormindo em casa, naquele sábado abafado, só tendo concordado com aquele passeio, tipo programa de índio, por insistência dela e dos filhos mal educados. Ela, gostaria de ter um marido que participasse mais,que como ela, apreciasse sair sempre, ter contato com a natureza, brincar com as crianças, tão livres quanto ela, ao invés de preferir passar os fins-de-semana dormindo no quarto, saindo somente na hora das refeições ou para assistir àqueles jogos insuportáveis pela televisão.
Queriam os dois sumir dali, um de perto do outro para sempre. Mas, como as crianças ignorassem o impasse em que se encontravam, arrefeceram os ânimos e enquanto ele telefonava para o reboque do seguro, ela fazia cara de emburrada, só quando olhava para ele. E continuava alegre, às risadas, brincando de pique-esconde com os filhos, em pleno acostamento de uma rodovia movimentada, até que finalmente, à tarde, foram socorridos pelo reboque, pondo um fim àquele pesadelo.

Conexão Saúde

Conexão Saúde: como ativar as energias positivas do seu organismo e ter saúde perfeita - Deepak Chopra

Apresenta, de forma simples, facilmente entendida, a concepção da física quântica e sua aplicação à saúde. Aborda a capacidade que todos nós possuímos de gerar uma nova realidade.
De forma geral, mostra que o homem faz parte da natureza, que existe uma inteligência por trás de tudo que há e que este é o ponto de ligação entre o homem e a natureza. É o que a física quântica chama de campo e que os terapeutas chamam de Self. No nível da consciência estamos ligados em teia a tudo. Quando estamos em contato com esse estado, esse nível de consciência alterada, somos capazes de criar a realidade.
Sabe-se que toda realidade é partilhada. Se a natureza é perfeita e fazemos parte dessa natureza, à medida que mais seres se conectarem com essa consciência, será possível alterar os estados de doença naturalmente e isto progredirá até que esta capacidade seja absorvida para todos os seres que, a partir daí, irão expressar esta possibilidade: mecanismos auto-reguladores, mecanismos de auto-cura.
A realidade depende do observador. Se nosso sistema de crenças admite a perfeição, ela passará a fazer parte da realidade.
Para atingir este estado de consciência que é natural, não temos que fazer esforço. É um estado além da vigília, do sono e do sonho. Para alcançá-lo devemos buscar o silêncio, o espaço entre os pensamentos, o vazio que é o mundo das possibilidades.
Esse caminho pode ser facilitado através da ioga (união), da meditação transcendental (usando por exemplo mantras como veículo) e de técnicas de hipnose. Só se conectando com este nível de consciência que é gerado a partir da consciência do universo é que podemos ser criativos e promover o que hoje ainda é dito fantástico: as curas espontâneas.
Mostra ainda como a medicina Ayurvédica se encaixa nessa nova realidade.
A nossa realidade é formada por aquilo em que acreditamos. Mas só mudamos nosso sistema de crenças atuando neste nível mais profundo, que não corresponde à consciência ordinária (que atua através da vontade).
Amplia esta visão para além da medicina.
É um excelente livro, de fácil leitura, bastante agradável e profundo.

sábado, 16 de maio de 2009

Irritação: o Fogo Destruidor

Irritação: o fogo destruidor - Torkom Saraydarian

Este livro nos mostra claramente a influência de energias invisíveis ao olho humano sobre o nosso organismo. Chama de ‘imperil’ esta energia que é gerada pela irritação, discriminando os vários fatores capazes de produzi-la, tanto externos quanto internos. Mostra como podemos nos defender evitando prejuízos à nossa saúde e como modificar posturas e comportamentos em nossa vida para minimizar a poluição das auras de quem se aproxima de nós.
As informações contidas neste livro se coadunam com os princípios da circulação energética, estudados pelas medicinas chinesa e indiana.É um livro excelente para nos auxiliar a lidar com o estresse do cotidiano, evitando ficar ancorado na raiva, estimulando a transformação pessoal.

Homenagem à Pintora (Therezinha)

Aqui estou eu, procurando encontrar palavras que possam expressar o que gostaria de lhe dizer, mas dificilmente saberei definir e traduzir as emoções proporcionadas por essa sua primeira exposição.
Quando a Vida, por razões que desconhecemos, determinou que ela fosse aqui realizada, senti mais uma vez que nada acontece por acaso.
Por que exposição Adrelírio Rios? Uma homenagem mais que merecida e justa. Ele tinha olho clínico para essas coisas, perscrutou sua alma e apostou na doutora, em verdade, na pintora de almas. E apostou certo.
Esta exposição é muito importante para você que almeja visualizar o futuro através da pintura, expondo suas emoções, alegrias e outros sentimentos, provavelmente até suas decepções. Cada um de nós traz de berço suas vocações (o artista atinge o âmago das pessoas através daquilo que lhe toca mais fundo). Mas lembre-se que a médica não pode abandonar a pintora e a pintora está ligada por Deus à médica.
Agora eu observo as pessoas que aqui estão, algumas como eu, que nada entendem de arte, mas que aqui vieram como um testemunho vivo dos seus primeiros quadros, sem cavaletes, sem telas, sem molduras. Sim, porque nem só com tintas e pincéis se faz uma pintura. Em momentos tão delicados que cada um deles viveu, foram essas mesmas mãos, essa mente poderosa que deixou em cada um a sua marca, na enormidade da fé, no consolo para uma dor, na esperança da cura.
Só pode irradiar muito quem muito possui, e o amor que você semeou mostrou uma realidade feita de sonhos. Esses foram seus primeiros quadros e, sem sombra de dúvida, os mais belos que você pintou. Doutor Adrelírio também deve estar por aqui, aplaudindo de pé a sua aposta acertada.
Pela personalidade, pelo seu amor aos que sofrem, pelo esforço das suas ações, serenidade na dor, caridade com todos, sinceridade nas intenções, bondade nos atos e, sobretudo, indulgência no juízo, fugindo aos devaneios de uma filosofia, você fez da sua alma você mesma, querida e estimada por todos que cruzaram seu luminoso caminho (você soube fazer amigos, você sabe viver).
Se algum dia o desalento invadiu o seu coração e lágrimas rebeldes romperam as represas, você soube ocultar dos companheiros de travessia.
Os seus quadros não retratam apenas o desabafo do seu inconsciente, mas a sua alma que, livre, tenta se manifestar. E nós os admiramos como quem penetra num sonho. Dizer que são lindos, a minha sensibilidade confirma. Em todo este multicolorido eu vejo borboletas esvoaçantes em travessas aventuras que nos transportam ao mundo dos sonhos. E sonhar é viver, pois alguém já disse que há sempre um sonho para ser vivido e há sempre algo para ser sonhado.
E com toda a emoção, quero lhe dizer obrigada por tudo que você fez e faz por mim. Eu sou também um dos seus primeiros quadros.

Estou Lendo...

O Corpo e Seus Símbolos: uma antropologia essencial, de Jean-Yves Leloup.

Ex-crever

Tenho pensado em escrever reflexões sobre a vida. Escrever como alguém que vive observando e procurando apreender o máximo de cada experiência, podendo assim dividir isso com outras pessoas.
Penso em funcionar como uma mensageira, alguém que deseja expor seus pensamentos, sua forma de encarar a vida hoje. E essa forma tem sempre evoluído. Acho que essa evolução, fruto de um aprendizado, se for comunicada, pode estimular uma transformação em outras pessoas.
As experiências, em si, podem ser interessantes ou não. Mas o interessante mesmo é exercitar formas diversas de senti-las. Porque cada pessoa encara um mesmo acontecimento de diferentes maneiras e uma mesma pessoa, em momentos diferentes da sua vida, é tocada de um jeito diverso pelo mesmo acontecimento.
Nós mudamos sempre. Mesmo aquele que se julga o mais estável dos indivíduos experimenta transformações. A mudança é a única coisa que é certa na vida de cada um de nós. E ainda que as transformações sejam apenas interiores, qualquer observador mais interessado poderá captá-las.
Gosto de quem escreve de uma forma densa, capaz de tocar profundamente os seus leitores. Sei que quando escrevemos nos expomos, em primeiro lugar, para nós mesmos. Então quando escrevo, prefiro ficar solta, a caneta no papel sem qualquer objetivo de comunicar alguma coisa. Simplesmente as orações vão-se formando sobre a folha em branco e comunicando para mim mesma o que meu Eu profundo deseja me dizer.
Eu escrevo da mesma forma que pinto meus quadros. Quando começo não sei o que vou pintar. A tela vai sendo manchada pelas tintas e, aos poucos, vai ganhando vida, me falando algo, me emocionando e, de repente, já tem vida própria. Mas, esse momento em que a pintura toma vida é inusitado. Vem de um toque do pincel, algum traço que amarra os demais e põe movimento naquela energia que estava estagnada. Antes desse momento não se consegue a satisfação. É o orgasmo das cores, é uma vibração que surge do nada, embora antes tenham participado, para a sua aparição, vários movimentos do artista.
Assim também ocorre no amor. Os amantes participam, movimentam-se, se encontram, se procuram, se percebem, gostam, captam um ao outro, mergulham fundo um no outro e, de súbito, uma explosão. É o êxtase, uma vibração que parece brotar não se sabe de onde, que não tem a ver só com a evolução dos movimentos, que é a energia liberada do coração de ambos, energia que interage, que ao transbordar dá o colorido final, que conclui tudo, que se sobrepõe a tudo, que é autogerada e que é o todo, o tao.
Eu quero comunicar, mas acho que se escrevo para me fazer entender por todos, não escrevo o que realmente desejo. Porque o que eu desejo é não escrever o pensamento ordenado. Eu, de fato, quero escrever o “não escrever” que, sei, tem a possibilidade de drenar o que há de mais verdadeiro em mim.
O que sai assim, sem a intenção de ser mostrado, traduz a nossa mais pura verdade. E deixar germinar essa semente, já é um objetivo grandioso, capaz de provocar alguma reação nos possíveis leitores.

Paciência

Se fores paciente por cem dias, ainda que possa ter um momento de raiva, escaparás da tristeza.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

O Ciúme - Caetano Veloso

Dorme o sol à flor do Chico, meio-dia
Tudo esbarra embriagado de seu lume
Dorme ponte, Pernambuco, Rio, Bahia
Só vigia um ponto negro: o meu ciúme

O ciúme lançou sua flecha preta
E acertou no meio exato da garganta
Quem nem alegre nem triste nem poeta
Entre Petrolina e Juazeiro canta

Velho Chico vens de Minas
De onde o oculto do mistério se escondeu
Sei que o levas todo em ti, não me ensinas
E eu sou só, eu só, eu só, eu

Juazeiro, nem te lembras dessa tarde
Petrolina, nem chegaste a perceber
Mas, na voz que canta tudo ainda arde
Tudo é perda, tudo quer buscar, cadê

Tanta gente canta, tanta gente cala
Tantas almas esticadas no curtume
Sobre toda estrada, sobre toda sala
Paira, monstruosa, a sombra do ciúme


Em Sintonia: a Arte da Ressonância

É um ótimo livro, da mesma autora de Viver de Luz. Ela faz uma revisão bibliográfica dos textos atuais mais importantes sobre medicina energética, física quântica e espiritualidade. Correlaciona muito bem as informações apresentadas por diferentes autores. Chama a atenção para a responsabilidade individual, a procura do contato com a alma como fator de transformação e cura, a busca de relações harmônicas entre todos os seres do planeta e tantos outros aprendizados que expressam a verdade de que somos seres espirituais numa existência terrena. É uma ótima leitura.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Estou Lendo...

Em Sintonia: a arte da ressonância - Jasmuhenn
Irritação: o fogo destruidor - Torkom Saraydarian

Cores Quentes

Iluminada manhã de primavera
Expandindo meu ser em cores quentes
Deixando um rastro de luz
Nessa trilha que faço em uma existência de paixões.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Incesto

Devemos despertar, em cada um de nós, a necessidade de nos mantermos alertas para acontecimentos deste tipo que frequentemente podem estar mais próximos de nós do que podemos imaginar. Penso que mais do que pensar em pena capital, nos torna responsáveis, no sentido de proteger os que estão perto, simplesmente admitindo que estes horrores existem.

Inspiração

Inspiração é a presença de Deus em nós.
Há momentos em que somos apenas um canal para sua expressão. Na verdade, é sempre assim, embora só raras vezes tenhamos essa consciência.
“Contacto a natureza, olho para os galhos de uma árvore percebendo realmente sua essência. Um quintal vazio e cimentado me traz reminiscências de uma infância rica de emoções.”
Sinto-me, agora, permeável ao mundo externo que, ao mesmo tempo, é filtrado, podendo perceber somente o que há de melhor nele.
E esta antena deve ser cada vez mais aprimorada para que possamos fazer a conexão com o nosso interior, com a fagulha divina em nós. Então seremos só beleza, harmonia e doçura no meio desse caos que a cada dia será maior, talvez para acentuar o contraste e estimular os homens ao encontro com eles próprios.
Que aumentem a dor, o desespero, a falta de ética, a decadência moral.
Que os poderosos tenham mais poder e se envolvam nas próprias armadilhas.
Que possam os homens finalmente se encontrar, frente a frente, com a sua verdade e, então, inteiramente despidos de tudo que neles é falso, renascer, vestir outra pele. E que essa pele seja reflexo para um mundo novo, que emergirá das cinzas de um passado destruidor, semente de glória e paz, de afeto e consideração, de fraternidade para todo o sempre. Amém.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Consciência

Atrás do vento vêm as tempestades e inundações. Não adianta correr nem lamentar o que havia no passado. O jeito é reconstruir tudo.

A Mulher e a Batedeira

Era uma senhora de olhar vivíssimo. Sentada em sua cadeira de balanço, tomava conta de tudo que se passava na casa. Não era uma cadeira comum, dessas austríacas. Não. A sua cadeira era corpulenta, como ela. Mais parecia um trono. E girava, para que a visão do mundo se assemelhasse à do gavião. Não era uma ave de rapina, essa mulher no alto dos seus oitenta e um anos. Era antes uma mãe, na concepção mais antiga da palavra, imagem de proteção calorosa por debaixo de suas asas, mas sem esquecer da visão aguda, da percepção do todo que era a sua marca e, principalmente, do olhar hipnotizador.
Agora, reinava em sua cadeira, de onde saía somente para o banho, descansar durante o dia, as horas de sono da madrugada ou para um ocasional passeio de carro que era o seu êxtase. No mais, permanecia sentada, atenta, interagindo com todos na casa, dando idéias, ensinando a fazer a comida do seu jeito, pois sessenta e tantos anos de cozinha não eram para se jogar fora e, afinal, queria a comida exatamente ao seu gosto.
Ela era meticulosa sim. E exigente. Tudo devia correr dentro do previsto. Acompanhava as horas. Havia em sua casa inúmeros relógios, em todos os cômodos, até no banheiro, em alguns lugares mais de um. Era justificado. Passara toda a sua vida, prisioneira do relógio ou, quem sabe, estimulada por ele, desdobrando-se nas tarefas domésticas. Tivera doze filhos e sempre se queixava, pois, desses, dois nasceram prematuros e não vingaram por falta de cuidados médicos. Os outros dois, de uma gravidez de trigêmeos, tiveram morte intra-útero, no sétimo mês, tendo sobrevivido só uma das filhas, hoje magrinha, mas muito forte e corajosa. Ah, seus filhos, sua criação, muitos, pois que sempre fora exagerada. Exagera ainda hoje, velhinha. Não é daquelas anciãs sábias, sequinhas. Ela é roliça. O neto diz que parece um bujãozinho. O rosto é redondo, vermelhinho com os dois olhos pretos como azeitonas. São olhos tímidos. Mas quando não se olha para eles - que então ficam envergonhados e fogem - são firmes e atingem os olhares mais difíceis.
Ela é minha mãe. Talvez por isso mesmo a conheça tão bem. Ou melhor, só passei a conhecê-la assim depois que afastei a idéia de que justamente era minha mãe. E mais, só pude vislumbrar a sua riqueza quando deixei de adivinhá-la; eu que sempre sabia o que esperar dela, presenteei-a com a liberdade de dela nada mais esperar, permitir que depois de tantos anos de vida pudesse ser o que realmente era.
Pois que essa senhora não era só a mãe prestimosa, aquela que fazia milagres com os parcos recursos do marido padeiro. Nem somente aquela que “batia” na máquina de costura madrugadas inteiras para poder formar os filhos em colégios particulares, seu maior orgulho. Ou alguém de extrema competência que arrumava, lavava, cozinhava, costurava para a família e para ganhar dinheiro, orientava, acarinhava e ainda estimulava a independência e auto-suficiência nos filhos. Só não lhe sobrava muito tempo para amar. Com a chegada dos filhos foi sufocando dentro dela o amor de mulher. Assim o seu corpo foi engordando de desejo represado. Distanciou-se de si mesma e do marido, seu amor. Não poderia vê-lo de fato, não poderia dispor de tempo para ela com tantos filhos sob sua proteção. E para não amá-lo com o desejo que tinha que sepultar dentro de si, só não o enxergando. Passou com os anos a ignorá-lo, a despeito de amá-lo tanto. E não olhando para ele deixava de olhar também para si. E dessa forma o tempo foi passando e essa distorção foi sendo tida como a realidade. Mas não era. A realidade que trazia em si era um amor forte, intenso, daqueles que o corpo parece não suportar de tão profundo.
Essa mulher escondeu-se de si por tantos anos que quase apagou o resto de doçura que guardava em seu peito, ainda hoje macio e acolhedor. Acho que por isto teve um infarto.
O amor motivou toda a sua vida. Mas escondia dos filhos e talvez do próprio marido o sentimento forte. Passava por alguém pragmático, que só se importava com as obrigações, que se fazia refém das culpas vindas não se sabe de onde. Escondia o fervor que tinha pela vida, a tendência romântica. Eu mesma, a caçula, cresci sem assistir uma vez que fosse a uma demonstração explícita de carinho entre os meus pais. Nunca presenciei um beijo, um abraço, salvo nos aniversários e no Natal, verdade seja dita. Pode-se dizer que ela endureceu para se proteger de si mesma. Que bobagem! Ninguém consegue fazer isso para sempre.
Agora essa mulher roliça, de olhos vivos, deixou-se florescer. Imaginem que se libertou depois que teve um acidente vascular cerebral! Deixou que caíssem por terra todas as suas resistências. É certo que somente depois de muito brigar e espernear, tentando manter-se como sempre tinha sido. Finalmente suavizou-se. Agora os seus movimentos são mais lentos, eu diria mesmo que ganhou uma certa sensualidade. A fala não é mais aquela rajada de metralhadoras de antes, quando ficava irritada. Fala pausadamente. E o ganho maior e mais surpreendente: a lesão cerebral deixou que sua emoção aflorasse. Que sábio é o organismo! Minha mãe chora com facilidade, emociona-se frequentemente, exagera como sempre, é certo. Esse coração, antes lacrado, escorre amor por toda ela que se derrama em doçura todo o tempo. Passou a ouvir músicas românticas, presta atenção às letras e proclama o amor com entusiasmo. Diz que todos os filhos precisam ouvir, que suas vidas, principalmente na área conjugal, melhorariam sensivelmente se eles seguissem os conselhos de Zezé di Camargo.
Em sua cadeira-trono ouve músicas de amor o dia todo. E se perto dela surge uma discussão mais inflamada, aumenta o som para abafar a confusão tão desnecessária. Essa sábia senhora continua ensinando a todos nós.
Minha mãe é assim, arrebatadora e surpreendente. Não é dessas velhinhas que esclerosam e passam a falar coisas sem muito nexo, se bem que, sabendo-se ouvir, nenhuma manifestação na velhice é de todo descabida. Ela mantém a coerência, só que consegue a transformação quase imediatamente, deixando os filhos atônitos por mudar de forma tão rápida seus pontos de vista de tantos anos.
Antes, ela ignorava a necessidade da vida afetiva dos filhos. Hoje, ela estimula. Antes, ela era rígida e agora é mais flexível do que a neta consegue ser. No passado, se torturava com o excesso de trabalho e hoje, se deleita com o lazer e faz questão de se presentear com passeios, descanso e festas. Quis festejar seus 80 anos, depois 81 e no próximo ano terá a festa dos 82 anos. Vejam só, ela que nunca fazia para si nem um bolinho de aniversário, só para os filhos, é claro.
Nessa jornada que foi a sua vida, o marido se foi há três anos. A propósito, ela teve o derrame enquanto ele estava internado numa clínica para idosos. Perdeu o seu amor com uma compreensão invejável. Aceitou a vontade da Vida. Depois de 63 anos juntos ele se foi. Não aconteceu de repente. Ele ficou preparando sua partida por cinco anos. Tão ligado a ela, não poderia ir assim rapidamente. Acho que ela foi-se acostumando a não tê-lo mais nos seus dias, pois que o guardava como um cão, sem muito espalhafato, mas acompanhando o dono com o olhar de um enorme carinho. Brigava com ele o dia todo, implicava pelas mínimas coisas ao invés de declarar logo seu amor, com palavras e gestos. Aprendeu, enfim, a duras penas, a demonstrar o seu afeto.
Por tudo isso, não me surpreendo de agora vê-la, quase todas as manhãs, de pé junto à bancada do armário da cozinha, de frente para a batedeira, sentindo o cheiro que vem dela dizendo palavras entre dentes, como se conversasse com alguém. E pasmem, até já a vi beijando a borda do eletrodoméstico! A primeira vez que presenciei a cena não entendi nada. Depois, observei o que fazia e lhe perguntei com quem falava. Ao que ela me respondeu: com o seu pai, ele vem aqui todos os dias. Sente só o cheiro na batedeira, disse-me ela. Agora ele está aqui. Quando não está, o cheiro some.
Ocorre que meu pai, antes de ser funcionário público, agente administrativo no Ministério do Trabalho, era padeiro. Foi gerente de padarias por muitos anos. Em toda a sua mocidade fazia pães deliciosos e no primeiro encontro com a minha mãe, onde trabalhava, ofereceu-lhe um lindo pão doce que naquele tempo vinha recheado (alguns exemplares, de surpresa para os fregueses afortunados) com aneizinhos. Nada mais coerente do que o que ela estava dizendo. Ele tinha cheiro de farinha, era o perfume daquelas mãos grandes e habilidosas, lindas que eu bem conhecia, e ela, muito melhor do que eu.
Passei a observar. Por várias vezes já senti o cheiro do meu pai naquela batedeira que hoje já não é quase utilizada, em ocasiões e datas importantes para a família. Às vezes, nem estou prestando atenção, conferindo se o perfume está ali e é o aroma que me atrai, me avisando que ele está presente naquele momento e acabo entendendo o porquê da sua visita. Confesso mesmo que, por várias vezes, conversei com o espírito do meu pai naquele lugar, em situações difíceis de nossas vidas, como se faz num santuário.
E para a minha mãe é simples assim: ele se foi, ela tem saudades, o amor permanece e liga os dois. Para ela, ele vem, ainda vive fora do corpo, ela sente o seu cheiro e o seu coração se alegra: ele está ali.
Minha mãe, a batedeira, meu pai, o amor unindo as pessoas, antes e depois da vida. A morte não existe mesmo, concluí.

domingo, 10 de maio de 2009

Mães Possíveis

Veio à minha mente a seguinte conexão: mãe-guardiã. Pensei no significado de ser mãe. Que complexidade! Que multiplicidade de formas de ser! Como vai além do estereótipo vinculado às campanhas comerciais! Que responsabilidade é ser mãe! Quantas cobranças! Que o digam os que frequentam consultórios de psicanalistas. E como é simples ser mãe deixando-se conduzir apenas pelo instinto!
Mãe é a que concebe, a que geralmente gesta, a que cuida, a que forma, a que guarda e protege (ou deveria). Cabe aos pais, à mãe, em particular, guardar o filho até que ele possa caminhar sozinho pela vida. E, neste aspecto, persiste a diversidade, cada filho tornando-se capaz no seu próprio tempo.
No seu dia as manifestações de apreço se multiplicam, seus valores ficam enaltecidos, a emoção transborda naqueles que contam com suas mães a seu lado e naqueles que a perderam por morte ou afastamento de qualquer tipo. E falam delas como se todas tivessem apenas aspectos positivos. E onde ficam a mágoa, o rancor, a rejeição, a omissão, a maldade, as perversões e tantas variáveis que fazem parte do humano? Porque cada mãe é de um jeito. E todas têm o direito de ser o que são nesta vida de aprendizados. Por que não concebê-las dentro da realidade de cada uma, ao invés de endeusá-las? Até porque a categoria mãe está intrincada numa teia complexa das relações humanas regidas por suas leis naturais, entre elas a de causa e efeito.
Entretanto, quando se fala de mãe, é certo que se acende em nós um grande letreiro luminoso onde se escreve AMOR. E a mãe de cada um expressa este amor dado em abundância, restringido, negado. Seja o que for, no fundo é amor.
Então não seria melhor, ao invés de idealizarmos, dificultando a relação, aceitarmos a mãe que temos, compreendendo, tentando perdoar, adorando, agradecendo de joelhos por ela, engolindo, caminhando ao lado, relevando, odiando, mantendo longe, substitindo etc., todas estas coisas juntas ou separadamente?
Todas as mães são importantes nas vidas dos filhos, mas nem todas são apenas anjos ou demônios. São humanas em toda a sua complexidade e diversidade. Há as que têm vocação para corresponder ao estereótipo, há as que são o oposto dele, há as que grudam nos filhos e exageram, há as que são distantes e omissas, há as chatinhas, as malvadas, as inúteis, as desajeitadas, as competidoras, as depressivas. Há tantas que não caberia aqui citá-las.
Mas para todas elas, as que trouxeram o filho à vida, as que cuidaram e criaram, as substitutas, as de consideração, aos pais-mães, a todos que representam esta categoria, cabe o respeito de todos nós.
E, certamente, cada um de nós, neste dia, terá a quem dedicar o amor e agradecer por ter honrado o título de mãe em sua vida.
Parabéns a todas as mães possíveis deste planeta.
Que possam ter sempre a liberdade de apenas ser.

sábado, 9 de maio de 2009

Nem Tudo Está Perdido

Fiquei pensando sobre o que tenho lido ultimamente aqui no Duelos, sobre o distanciamento entre as pessoas que parece existir hoje. E fui recordando situações que também tenho observado e que denunciam esta rejeição voluntária de gente por gente. Concordo que o que parece estar acontecendo é que as pessoas têm medo, constrangimento ou mesmo falta de desejo de proximidade com desconhecidos, reservando, na maioria das vezes, os seus sorrisos e mesmo um simples olhar somente para os que lhes dizem respeito.
Assim, parece tão estranha essa correria do dia a dia, as relações tão impessoais no trabalho, as pessoas da mesma família que mal se olham depois que voltam para casa, as relações fugidias que se estabelecem nos momentos de lazer e mesmo os relacionamentos de amor tão esvaziados hoje do contato profundo, por também, quase sempre, este ser negado a si mesmas. Realmente é muito incômodo, para os que amam e se interessam pelas pessoas, serem privados da sua atenção e substituídos por estes aparelhinhos irritantes que berram outras palavras que não as suas, inigualáveis e insubstituíveis pelo simples fato de serem do seu interlocutor em potencial no irretornável momento presente, semente da mais maravilhosa relação de sua vida, talvez, por mais interessante que possa ser o que eles estejam ouvindo.
Mas penso que isto não está acontecendo por acaso, até porque muitas pessoas que reclamam disto também costumam ter comportamentos de ignorar as outras pessoas, sem se darem conta. Quantas vezes andamos pelas ruas e olhamos de fato para os que passam por nós? Será que no contato com as pessoas de nosso trabalho paramos para observá-las, realmente, na sua emoção e profundidade ou somente notamos a sua capacidade de trabalho naquele dia, nos ocupando apenas com críticas e julgamentos? As pessoas que se relacionam com a gente diariamente passam por transformações e acontecimentos marcantes em suas vidas, olham para nossas caras todos os dias e acabamos sabendo destes fatos relevantes só muito tempo depois, sem que tenhamos mesmo apenas suspeitado deles, ainda que estivéssemos ali todo o tempo. Estranho isto, não?
O fato é que parece que não temos tempo para o outro, porque não temos tempo para nós mesmos. E isto gera um incômodo tão grande que tentamos nos distrair para não enxergar do lado de fora o que reflete o grito que abafamos dentro de nós mesmos. Eu penso é que a realidade está tão difícil de encarar com todas as suas distorções de desigualdades, tristezas, injustiças e dores (que não se consegue compreender a não ser que se afine o olhar), que é preferível, para muitos, se refugiarem no seu próprio mundinho, protegidos por algo que os isole dentro de um universo particular, primorosamente concebido dentro das suas preferências.
Então o que fazer para resgatar a proximidade com o outro, esse nosso semelhante?? É preciso que tentemos enxergá-lo como tal, percebamos que estamos todos no mesmo barco e que os tempos são de vento nordeste; que há pressa sim, porque os dias agora parecem durar só 16 horas e não 24, como antes. Então, meus caros, nada de nostalgia de cadeiras nas calçadas, cartas escritas de próprio punho para amigos ou amantes, conversas acaloradas nos bancos dos ônibus entre aqueles que nunca tinham se encontrado antes, embora estas gotinhas de felicidade ainda possam existir e realmente aconteçam. A gente tem que se virar mesmo é com o que está disponível e ir tentando se afinar com formas de comunicação mais sutilizadas e rápidas, com o mundo virtual.
Da mesma forma, penso que as transformações que estão ocorrendo de forma tão rápida no planeta e que nos colocam num estado de alerta, com tantas catástrofes naturais, ao mesmo tempo também muito nos ensinam sobre responsabilidade com o meio ambiente e desapego.
Esta aparente distância entre as pessoas pode significar o estímulo para o aprendizado e a utilização de novas formas de relacionamento entre os homens, mais sutilizadas, eficazes e talvez mais profundas em que sejamos capazes de captar com um olhar mais abrangente, pelo entrelaçamento das auras ou pelo simples sentir o outro, muito mais do que as palavras e gestos explícitos de carinho poderiam transmitir.
Portanto, é imperioso ampliarmos os nossos sentidos indo em direção aos outros, sem distinção de quaisquer qualificações tão irrelevantes hoje, de raça, cor, credo, gênero, posição social, preferência sexual etc.
Não está longe o dia em que o amor será a regra e poderemos nos atirar com confiança, buscando nossos semelhantes para relações baseadas no respeito, liberdade, igualdade e fraternidade.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

A Cama Rosa

Conversando com uma amiga pelo telefone percebi sua voz diferente. E esta percepção permaneceu nos dias subsequentes. Mas eu não conseguia precisar qual era a diferença. Resolvi perguntar-lhe. Ela ficou surpresa. Não havia notado em si, a princípio, nenhuma diferença. Também as outras pessoas nada lhe haviam dito. Mas eu insisti por várias vezes e ela acabou notando que realmente estava diferente. Tentamos esclarecer qual teria sido a mudança. Mas era difícil captar, expressar com palavras. Finalmente entendi que ela estava mais segura, sua voz mostrava que se sentia mais plena. Ela concordou e buscou saber o que teria proporcionado isto. Avaliamos desde quando estava assim. Quando chegamos ao momento em que ocorrera a mudança, ela logo a associou a um acontecimento: foi depois que chegou a sua cama. Havia comprado, há alguns dias, uma cama nova. E eu quis então saber qual a relação. Por que uma cama nove trazia aquela nova forma de estar no mundo?
Aí começa uma história que me tocou profundamente e tento agora dividir com aqueles que tiverem sensibilidade para percebê-la na sua totalidade.
Minha amiga foi criada, até por volta dos 5 anos, pelos avós. Neste tempo foi respeitada, cuidada, percebida como pessoa em toda a sua expressão. Foram tempos bons de receber carinho, de moldar toda a existência que teria pela frente. Mas um dia seus pais a levaram de volta. Separou-se dos avós, indo para onde não queria. E para minorar a saudade de tudo, o avô presenteou-lhe com uma cama, para que quando fosse dormir pudesse lembrar-se deles, dos momentos vividos antes. E a cama tinha a guarda cor-de-rosa, com losangos de contornos brancos, em sintonia com o que a cama lhe trazia: o preenchimento do sentimento, o afago no coração, na sua sensibilidade. Assim desfrutou, por muito tempo, desta proximidade com os avós, como um tempo de amor, de cuidado, de alegria.
Um dia, voltando da escola, encontrou os pais, enlouquecidos que eram, na sala, costurando capas de napa de cor marrom ou verde-escuro em espumas, fazendo colchonetes que não compreendeu de imediato para que serviriam.
Então indagou-lhes o que era aquilo e como resposta ouviu que agora os filhos dormiriam nestes colchonetes, sem travesseiros, porque era muito saudável para a coluna vertebral. Espantada, queria saber de onde haviam tirado aquela ideia. Responderam que era assim na Índia. Estava decidido. E as camas, o que seria feito delas? As camas? Já estava tudo resolvido. Correu para o quarto, que encontrou vazio. No quintal, uma fogueira quase no fim, onde ardiam os restos de sua cama rosa. Desesperou-se. Correu até os pais e gritou sobre o porquê daquilo. Chorava, vendo em chamas os seus sonhos acalentadores, a sua proteção, o cuidado dos avós, a segurança da sua alma. De nada adiantava aquilo. Não entendiam. Eram loucos. Sofrimento. Desamparo. Endurecimento. Sensibilidade exposta. Carne viva.
O tempo passou. Ela e os irmãos passaram a dormir nos colchonetes que logo ficaram mais finos, trazendo o frio do corpo no contato com a umidade do solo e o frio da alma, sozinha. Os pais continuaram desfrutando de sua cama com os travesseiros macios.
Nunca mais teve uma cama só sua. Por várias razões isto não tinha acontecido. Sempre morara com outras pessoas e tinha sido necessário dividir a cama ou sempre trabalhara muito e, exausta, às vezes dormia em algum sofá. Nunca mais a cama rosa sonhada.
E agora, sem que tivesse a princípio percebido o significado do seu ato, havia encomendado uma cama. Era algo sem muita importância. Precisava montar seu quarto, buscou uma cama. Difícil achar uma que a agradasse. Não era rosa. Então encontrou uma em tons de marfim.
Um dia a cama chegou e, sem que se desse conta, reencontrou, ao nível da alma, o cuidado dos avós, o carinho, a proteção, os dias felizes da infância. Era agora outra, a voz denunciava. Era outra vez ela mesma, por isso mais segura se anunciava.
Eu me emocionei com esta vivência. Outros também se sentiriam tocados. Todos nós, certamente, temos, em algum lugar das nossas vidas, a nossa cama rosa, nosso lugar sagrado, o refúgio da alma.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Imaginação - Sanaya Roman e Duane Packer

Sua imaginação tem um alcance maior do que você pensa. É o vínculo mais íntimo com a alma. Não é limitada por programas, crenças e medos do passado. A imaginação foi-lhe dada para você poder transcender o mundo físico. Ela lhe dá a capacidade de superar seus limites pessoais e descobrir seu maior potencial. Sua imaginação pode viajar para qualquer dimensão ou mundo. Pode criar caminhos futuros inimaginados para você e ajudá-lo a ver os possíveis resultados de várias opções.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Analogias

Para bom observador, tudo são analogias, similaridades...
Depois da perda, o dia seguinte é como o sol que nasce e estala de tão quente, após a chuva pesada.
O tempo de chuvas foi triste, sombrio, porém deu fluxo à vida, limpou as folhas velhas das árvores, arrasou, destruiu muitas coisas que já não tinham mais razão de ser. Esfriou, fez os corpos gélidos, contraídos em dor.
E agora, o sol que chega outra vez, traz vida nova aos corações e, da mesma forma que seca as gotas de chuva nas folhas mais vivas, resistentes que sobraram nas copas das árvores, enxuga as lágrimas das faces que, após os soluços de dor, ganham novo brilho e luz para esperar um novo dia.
Tudo na existência é manifestação da perfeição.
Os símbolos nos auxiliam a compreender onde se encontra o belo.

domingo, 3 de maio de 2009

Lealdade

Não altere seu comportamento genuíno para contentar aos outros, cada um deve estar em paz consigo, ser leal apenas a si mesmo.

Revivência

Chão de paralelepípedos unidos por grama verdinha no pátio do lugar onde trabalho. Mangas maduras caídas, manchando o chão meio coberto de folhas secas, deixando no ar o odor adocicado da infância, quando existia um quintal com a copa da frondosa árvore, a mangueira da casa do vizinho, debruçada para além do muro.
Imediatamente estou outra vez lá. Experimento a segurança e o conforto do cheiro de manga pisada, caída do pé, ao mesmo tempo em que o corpo adulto se arrepia de medo, enquanto a menina sente nos cabelos e no rosto, a mesma ventania que sacudiu os ramos da árvore e abalou uma tarde calma de fim de primavera.
Foi assim que transpus, no mesmo instante, a ponte para o passado, expressada pelo conjunto de lembranças impregnadas de emoção e ancoradas nas impressões dos sentidos.
A partir de então, por todo o dia eu estaria habitada por recordações do tempo de menina naquele quintal e repassaria todos os acontecimentos que me viessem à mente, agora com a perspectiva da mulher, domando as emoções ainda deslocadas, podendo compreender e reescrever essa parte da história da minha vida.

sábado, 2 de maio de 2009

Da Dificuldade de Enxergar o Mal

Vivemos num mundo de polaridades. Mas, porque é tão difícil para alguns de nós enxergar a escuridão? É necessário estar aberto para a possibilidade do mal, para poder lidar com ele e proteger suas vítimas que não se restringem aos que sofrem, incluindo também o agressor. É rotina nos pronto-socorros, lesões em crianças e idosos, decorrentes de violência ou negligência por parte de pais, familiares e cuidadores.
Crianças e idosos sofrem agressões e lesões decorrentes da falta de proteção por parte de seus responsáveis. Desatenção, esquecimentos, verdadeiras ciladas e armadilhas representadas por situações e utensílios e móveis existentes na própria residência ou fora dela, custam muito caro para quem em determinada época da vida precisa de proteção.
E cabe aos profissionais de saúde buscarem informação, quando na sua vivência não encontram experiências desse tipo para ajudarem no diagnóstico. Há quem se comporte como se vivesse na ilha da fantasia e deixa passar, atribuindo ao acaso ou acidente, lesões corporais em crianças e idosos por violência explícita ou abuso sexual, por não terem tido contato no meio em que foram criados, com estas práticas abomináveis. Precisamos admitir que como humanos (Irrc!), todos nós e qualquer um de nós é capaz de qualquer coisa, desde que haja condições propícias.
Admitindo que a maldade faz parte de nós, estaremos nos protegendo mutuamente: vítimas e agressores.

Sensações (Misturas e Cores)

Misturar. Esta ideia me veio de súbito. Parte de um com parte do outro: coisa nova que surge. Comunhão. Talvez. Tão clara em mim esta sensação hoje.
Fazemos parte de um todo que depende de cada um de nós. A vibração do mundo que é formada pelas emanações de cada um de nós. A responsabilidade que há nisto, em cada ato nosso, em cada pensamento. Olhar para os outros com o amor e a consideração que devemos dispensar a nós mesmos. Gosto de misturas, do resultado das combinações em tudo. Mas mistura de partes que têm algo em comum, que podem compartilhar, que são abertas para permitir entrar no outro e serem invadidas, diferente de água e óleo.
Óleo me lembra tela que me traz tintas. Vejo a tela branca e as tintas coloridas que vão sendo colocadas no branco, que dançam levadas pelo pincel e se juntam às cores de outras e explodem em tons novos, multicoloridos. É vida nova despontando.
Os cheiros que se combinam, das peles que se tocam e se modificam pela delícia do contato, exalando perfumes que se misturam e impressionam olfatos de novas formas tão particulares, com mudanças às vezes tão sutis, mas que marcam e tocam uma profundidade tão imensa e especial.
Meus sentidos se assanham com as cores e penso que assim é com todo mundo: primeiro os olhos, mas as coisas têm cheiro e gosto e textura também. Um prato cheio de cores é recebido pela língua de forma totalmente diversa da comida monocromática. Gosto de ter todas as cores que puder no mesmo prato e ir provando cada uma delas, sentindo a temperatura da cor, o gosto da comida, me sentindo arrepiar todas pelas cores ácidas ou picantes e me deixando amansar pelas cores doces. E sentir, ao mesmo tempo, mais de uma cor na mesma parte da língua é especial. É certeza de novo sabor, nova vida que se percebe, é mais uma parte de mim que se aguça.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Traição: A Busca Equivocada pela Transcendência no Amor

O que nos levaria, num nível mais profundo, a trair, mesmo nos relacionamentos em que há um amor inquestionável?
Porque mesmo em casamentos, com e sem aspas, em que há harmonia, complementariedade, paixão, amizade, companheirismo e outros ingredientes indicadores de profundidade em relacionamento amoroso, ainda assim, o fantasma da traição insiste em rondar?
Ainda que a traição não se concretize, é inegável que alguma vez já se fez presente nas fantasias, mesmo daquele parceiro mais convicto, que tem a certeza de ter encontrado a sua alma gêmea e estar feliz e realizado com ela.
A Astrologia nos explica que buscamos no outro aquilo que nos falta e a vivência de um relacionamento profundo, ao longo do tempo, irá preenchendo nossas lacunas com um aprendizado do outro, de forma que nos transformamos e o interesse só permanecerá se ambos evoluírem, permitindo que possamos sempre encontrar no outro, novas possibilidades de crescer e mudar. A estagnação de um faz o casal alcançar um equilíbrio pernicioso onde o desinteresse mútuo é solo fértil para a traição.
Não falo em motivações menores, nos jogos de sedução, no troca-troca ensejado pelo próprio aprendizado no mister do amor. Desejo sim entender as raízes da traição nos relacionamentos maduros e bem sucedidos. Nem me importo com as traições de fachada, em que na realidade nem relacionamento de fato há. Também não me ocupo aqui das traições fugazes, devidas ao ciúme, às vinganças, à afirmação de personalidade ou outras questões relacionadas à imaturidade. Ou ainda daqueles que, por natureza, precisam de mais de um objeto de amor.
A interrogação e o questionamento aparecem ao ter conhecimento na vida de outras pessoas ou experimentar na própria vida, um sentimento que domina, que ultrapassa a razão, que clama e que faz tão bem, porque expressa mais que tudo o estar vivo, receptivo, ainda que venha associado ao enorme desconforto de estar magoando alguém tão próximo, tão querido, tão vital para nós, de quem não desejamos nos afastar, embora quase sempre resulte em separação, culminando numa culpa que sufoca e faz surgir baixa estima, exatamente quando experimentamos a felicidade de ceder à espontaneidade.
Como lidar com a liberdade da alma, o êxtase que tanto atrai e faz retornar um estado só experimentado na infância, quando ainda não estamos peritos em nos reprimir?
Tenho a certeza de que esta traição é uma condição arquetípica e, como tal, deve ser compreendida para nos redimir da culpa e sanar a dor de nossas “vítimas” que em outra oportunidade poderão ser os “algozes”.
O entendimento de que nesta vivência, a questão não é pessoal, retira todo o peso e reatividade. Temos que examinar a situação da mesma forma como numa regressão à vivência de uma vida passada, como meros observadores, mesmo que durante o processo de encarar os fatos possamos nos permitir a revivência para esvaziar a dor emocional. Aquele que trai, o faz por motivações próprias que mesmo estando também relacionadas ao parceiro, representam a tentativa de concretização dos anseios de sua alma.
Traímos porque é bom encontrar alguém que encarne o poder de nos tirar da razão (talvez pela sedução do proibido), de nos hipnotizar a ponto de nos largarmos, cedendo aos apelos de nossa alma. Quando traímos, não estamos menosprezando ou desrespeitando quem ainda amamos. Estamos sim, valorizando e dando vez a uma parte nossa que é vida, é ânsia, não se consegue reprimir. E quem o motiva, não é que seja sempre nem tão especial assim, exceto pela capacidade de despertar em nós a vontade de ir além, de transcender, de sermos levados por algo maior que nós, que não ouve nossa mente crítica e politicamente correta, mas somente deseja expressar todo o amor que tem e que em dado momento extravasa a relação primordial, acompanhando a expectativa do novo, do desconhecido, o salto do louco,prenúncio de felicidade. No fundo é só a expressão do amor num sentido mais amplo.
Não nos julguemos pois. Apenas compreendamos nossa força que nos pode permitir fraquezas como esta, ainda que concretamente, sejam equivocadas.